quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

O Deus que intervém não existe

Renato Vargens publicou um post sobre o deus do teísmo aberto: Eu não acredito no Deus do teísmo aberto. É uma crítica à teologia do inglês Tom Honey. Como Vargens, também não acredito nesse deus, mas parece que ele está se tornando popular. Recentemente foi divulgado no Brasil um texto trazendo a expressão que "o Deus que intervem não existe", defendendo um Deus que lamenta, se solidariza, mas não intervem no curso da história. Essa é mais uma investida do teísmo aberto com ares tupiniquins, trazida por pensadores brasileiros que têm recebido fama e acolhida em muitas revistas evangélicas e circuitos de palestras.
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O "Deus que intervém" (tradução do título de um livro de Francis Schaeffer para o português – "The God Who Is There") é o Deus da Bíblia e só posso supor que o deus do teísmo aberto não é o Deus da Bíblia. Fico pensando que esse deus é um outro deus e não o Deus que ao longo da história mostrou-se, ao intervir, o Senhor dela, apesar da visível dor humana que tanto nos marca. O problema do deus do teísmo aberto é a sua incapacidade de intervir.
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Mas, segundo a Escritura, a intervenção de Deus, no que podemos conhecer dela, começa na criação, ainda que tenha nos amado antes da própria fundação do mundo. A partir de então, não parou de intervir, seja falando, agindo, alterando, mudando, fazendo tudo o que condiz com os seus propósitos eternos. Se a Escritura é de fato a Palavra de Deus, sua revelação, então o Deus que intervém existe e foi o Deus de Jó, homem que sofreu profundamente para aprender quem Deus é e que, finalmente, pode ver a Deus. Mesmo tendo sofrido, viu a graça do Deus que intervém restaurando-lhe.
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O Deus da Bíblia é o Deus que é todo amor e justiça, verdade e misericórdia. É o Deus que ama e que é ofendido pelo pecado humano, ao contrário da caricatura criada pelo teísmo aberto, e que pode estar impregnada na mente de muitas pessoas. Aliás, o pecado é a grande ofensa contra Deus e não há como ler a Escritura sem perceber isto. É interessante notar que os teólogos do teísmo aberto tentam usar a Bíblia para provar o improvável por meio dela: 'o deus que intervém não existe.
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Aliás, há uma ironia aqui: O livro de Schaeffer que teve o título traduzido como "O Deus que intervém", literalmente chama-se "O Deus que está lá", o que não faria tanto sentido na língua portuguesa. Schaeffer escreveu o livro com este nome exatamente para mostrar que na cultura do final do século XX, influenciada pelos muitos anos do desenvolvimento científico e cultural do ocidente, Deus tornou-se uma construção ideológica e não o Deus da Bíblia. O Deus que intervém e revelou-se em Jesus Cristo foi transformado pelo racionalismo humanista em um deus impotente, facilmente substituído pela capacidade humana.
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Na sequência da famosa trilogia de Schaeffer, ele escreveu "He is there and He is not Silent" ("Ele está lá e não está calado"), traduzido no Brasil como "O Deus que se revela", exatamente para mostrar que este Deus todo poderoso, o El-Shaddai, sempre controlou a história e se revela, trazendo esperança ao homem. O livro de Schaeffer trata a respeito deste Deus fazendo uma defesa da epistemologia do cristianismo histórico e bíblico, de "como podemos vir a saber e como podemos saber que sabemos". O deus do teísmo aberto, aparentemente se revela só no sofrimento, é fraco, incapaz de alterar qualquer coisa na história. Quando esse deus vê o sofrimento e a tragédia humana, como os acontecimentos recentes das mortes em Ilha Grande, Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, só pode chorar, sem fazer nada. A meu ver, é a Morte da Razão tentar defender um deus como esse (o terceiro livro na trilogia de Schaeffer).
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O Deus da Bíblia é o Deus de Abraão, Isaque e Jacó; o Deus de Moisés, Davi, Isaías e Jeremias; o Deus de milhares que foram levados para o cativeiro, anonimamente, sofrendo e, ao mesmo tempo, consolados pela sua presença e certeza de que os traria de volta, senão eles mesmos, os seus filhos, porque ele disse que os traria; o Deus de Daniel, um cativo 'de elite' que, ao perceber que havia chegado a hora que Deus disse que iria intervir, orou reconhecendo os seus pecados e os de seu povo e rogando que Deus agisse de acordo com sua eterna aliança (Daniel 9). Se o sofrimento do povo de Israel na ida para o cativeiro não foi para cumprir os propósitos de Deus, vamos ter que arrancar a metade dos escritos dos profetas da Bíblia (Isaías, Jeremias, Habacuque, etc.). Mas o Deus que intervém ordena a sua bênção para sempre (Salmo 133), bênção esta iniciada na ordem Edênica (Gênesis 1.28) e alcançada em Cristo, sempre para cumprir o seu eterno propósito.
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O deus do teísmo aberto não passa de uma imagem construída por homens e, como caricatura, é uma péssima obra de arte. Mas, o Deus da Bíblia já enviou a sua imagem perfeita (Hebreus 1.3) para que conhecêssemos o perdão dos pecados, a sua intervenção na história e, finalmente, a redenção de todos os seus eleitos. Assim como fez no passado, continua a intervir hoje, pois ele sempre foi, é, e será o mesmo Deus, queiram os homens ou não.
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O deus do teísmo aberto não é o deus da Bíblia e não é o deus daqueles que de fato creem nela. O eterno propósito desse deus é chorar com os homens. Pobre deus, pobres homens que acreditam nele.
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Para saber mais sobre o teísmo aberto, recomendo o livro de John Frame, "Não há outro Deus" (Cultura Cristã) e também o artigo na Fides Reformata, A TEOLOGIA RELACIONAL: SUAS CONEXÕES COM O TEÍSMO ABERTO E IMPLICAÇÕES PARA A IGREJA CONTEMPORÂNEA (Valdeci Santos).

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